cheguei mais cedo do que o habitual.
está um calor atrofiante na sala de espera. a recepcionista é muito friorenta, pelos vistos.
à minha frente está uma rapariga com ar enfezado e doente. com ar enjoado. afundada no sofá, como se nas suas costas carregasse o mundo. será que já me terei sentado assim, aqui?
o pé direito abana ao ritmo da música, que vem mesmo a calhar “she’s a maniac, maniac”.
enquanto escrevo, sinto que me observa. o nosso olhar já se cruzou algumas vezes. hoje, particularmente, estou com um ar descontraído, feliz e confiante.
pergunto-me o que irá naquela cabeça de corpo magricela, enfezado. provavelmente, as mesmas perguntas que fará ao olhar-me.
(às vezes, é constrangedor o silêncio que se abate neste espaço, algo pequeno. as pessoas observam-se, como que procurando identificar algo nos outros, que as sossegue. que as torne mais iguais.)
ela levanta-se, pegando na carteira. ao dirigir-se à sala, sinto-a observar este caderno pelo canto do olho. enquanto caminha.
23.11.2004