a fabulosa, ali mais abaixo, desafiou-me (ela passa a vida a desafiar-me, caneco!) a postar aqui algumas aventuras de quando era fogareira.
fui buscar uma que, em 2006, coloquei no ante & post, um blog onde me diverti imenso e conheci gente bué, bué, mesmo!!
para quem me lê há muito é uma repetição, mas arrisco (não serão, certamente, assim tantos os que me acompanham desde o início – haja paciência!!)

os tremoços do Bilhas, ali em baixo, fizeram-me recuar uns anitos. poucos. coisa para vinte e um.
num período sabático escolar, eu às vezes descubro-me com umas piadas giras, porque esse período ainda hoje dura, esse e o outro, mas agora não vem ao caso, mas dizia eu, num período de calinice escolar pura e dura, andei a trabalhar com o táxi do meu pai. um peugeot 504 com tecto de abrir e direcção assistida aos meus pobres bíceps.
eu, que sempre sonhei com os dezoito anos para poder tirar a carta, adorei o desafio.
tinha uma concorrência feroz, já que os meus colegas da praça não me achavam grande piada e tentavam por tudo que eu não tivesse clientes. isto numa vila algures no centro do país, chamada Miranda do Corvo. mas aos poucos, e muito em parte pelos conhecimentos do meu pai, fui arranjando uma clientela fixa, na sua maioria mulheres.
o dia de maior movimento era a quarta-feira, dia da feira semanal, muito concorrida e uma das melhores das redondezas. claro que a clientela era, na sua maioria, gente que vinha vender as suas coisas à feira. o que quer dizer que no máximo às sete horas tinham de lá estar, com pena de não encontrarem os melhores lugares de venda.
começava às seis da manhã. em direcção a sul e virava para Godinhela. um pouco mais à frente, numa aldeola quase desabitada, apanhava um casal de velhotes, muito querido, sempre juntos para todo o lado, e que aproveitavam o dia da feira para irem ao médico, sempre poupavam nas viagens. recordo o cheiro intenso a fumo da lareira, que as suas roupas deitavam.
de seguida, voava em direcção a Lamas, para ir buscar a D. Ilda. tinha de aproveitar para andar depressa quando não levava passageiros. para além de não os querer assustar, arriscava-me a que eles andassem numa montanha russa no banco de trás, tal a quantidade de rectas que as estradas tinham. lá trazia calmamente a D. Ilda, porque ainda era cedo. na viagem de regresso, por volta das quatro da tarde, a D. Ilda já não estava tão calma. os almoços, meus caros, os almoços consistentes pediam acompanhamento.
a saga dos fixos da manhã terminava com uma ida ao Padrão, na estrada que vai para a Lousã. aí, tinha três clientes que eu adorava. mãe e duas filhas, as três bem preenchidas de carnes, e com uma disposição fantástica. saía do carro, abria a mala e elas carregavam-na o quanto podiam com sacos de tremoços! cozidos, claro! quando as largava na praça, deixavam-me um saco com três ou quatro medidas, que eu ia devorando com o passar da manhã.

e pronto, foi disto que me lembrei, quando vi o post do Bilhas.

talvez um dia fale da bruxa de Godinhela, do Carlos do Gondramaz, das minhas idas à feira dos Cabaços ou da senhora que levei à Casa do Gaiato para ver o neto e que, ao ver que eu chegava à hora certa que tínhamos marcado para o regresso, vira-se para mim e diz “oh homem, você é mesmo pontual!”